Adeste Fideles!

 ADESTE FIDELES
LAETI TRIUNPHANTI

Venite, Venite in Bethlehem!


Todos vós, fiéis! Alegres e triunfantes! Venham, venham todos até Belém! 

O Natal costuma, ao menos em seu aspecto religioso, passar despercebido. Não me entenda mal; sei que o Natal é uma festa familiar da mais alta estatura, a maior das festas de todo o Ocidente moderno. É o feriado dos feriados. Cidades inteiras são transformadas para a festa: de árvores de natal modestas em um consultório de dentista à grandes estruturas enfeitadas com jóias Svarovski, o Natal amolece os corações duros e faz as famílias - afastadas, por vezes - conviverem harmoniosamente.

Nas casas e apartamentos, pequenos presépios são montados ao lado de algum objeto de decoração, em cima de uma mesa encostada na parede. Em famílias mais tradicionais, o menino Jesus é colocado na manjedoura apenas na madrugada do dia 24. Faz-se uma oração meio mixuruca - por vezes misturada com toda sorte de bobagens -, todos apertam e chacoalham as mãos no "amém" do Pai-Nosso e vão-se à mesa.

Mesmo com toda a pobreza religiosa do natal moderno, ainda há um feeling que circunda a festa. Parece haver uma sensação de mistério, de pertença à uma família, de celebração abrasiva, mas silenciosa (Laetitia) e de alegria interior (gaudium) que não se vê em qualquer outra celebração cultural do ocidente, nem mesmo a Páscoa. 

Além da clara decadência intelectual que faz os aspectos mais belos da fé serem incompreendidos - ou desprezados - pelo homem moderno, me parece que o mundo esqueceu-se do que é, de fato, a alegria do natal. 

Pense bem: durante séculos sem fim, o homem anterior à Cristo questionou-se a razão de suas misérias. Aristóteles, por sua vez, criou uma inteira teoria sobre a vontade e a felicidade humanas, crendo firmemente que a repetição levava à virtude, e que a felicidade verdadeira só poderia ser alcançada pelo homem virtuoso. 

Algum tempo depois, nasce, em uma pobre cidade da Judéia, um menino chamado Ieshua, que significa "Deus salva". Em pouco tempo, o próprio Rei Herodes percebe a grandeza daquele indefeso bebê, e manda que todos os primogênitos do seu reino sejam mortos, para que ele mesmo não seja destronado - pasme - pelo pequeno menino. 

Em contrapartida, 30 anos depois, o pequeno menino se torna um homem completo, que prega uma mensagem que só poderia ser pregada por um louco (ou pelo próprio Deus). 

Ora, nem mesmo nessa pequena descrição histórica se encontra a real razão da festa do Natal. Não comemoramos a grandeza de um homem, a força de sua "mensagem de amor", nem mesmo os motivos nobres dos "valores", da "saúde", da "família" ou, até mesmo, como poderia dizer Aristóteles, da "virtude". 

O Natal é mais profundo e ainda mais misterioso. Há um "quê" de mistério na realidade que passa despercebido ao homem que não sabe mais o que poderia ser um mistério. 

O Natal é a festa da pobreza divina. Ora, o criador dos céus e da terra, das criaturas visíveis e invisíveis é, agora, um pequeno bebê. Aquele a quem todos deveriam - e ainda devem - temer, o mesmo que mandou as pragas ao Egito, dizimou Sodoma e Gomorra, mandou um dilúvio e expulsou Adão e Eva do paraíso é, agora, um bebê necessitado de nós. 

Aquela criança é, ao fim, o Rei dos Reis, Cristo Rei do Universo, Majestade Infinita, a Virtude em si mesma, a eterna felicidade, o Sumo Bem dos homens. E, este mesmo Rei, a quem toda a humanidade deveria temer e servir, é agora uma criança que dorme em uma manjedoura. 

Conta-se, no Gênesis, que Deus passeava pelo jardim. Em interpretação mística, o jardim é, nada mais nada menos do que o próprio homem: a alma humana. 

Eis aí a grande boa-nova: se um dia, Deus passeava no coração de Adão e Eva, o fazia apenas espiritualmente. Tornando-se um de nós, uma pessoa (quem?) divina e humana (o que?), Deus pôde unir-se da forma mais íntima possível à mim. 

Eis o Natal: a festa em que o menino celebrado dormia, porque finalmente encontrou o jardim que tanto procurava para, no sétimo dia, descansar

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